terça-feira, 20 de outubro de 2015

Isto não é um relato de uma maratona

A minha mãe gosta de contar a história de como eu em pequenina caminhava com todo o cuidado pela praia, contornando todas as pegadas na areia para não pisar o que eu dizia serem 'buracos'. Não me lembro de alguma vez ter subido a uma árvore, nunca parti nada, nunca levei pontos, conto pelos dedos de uma mão as vezes que esfolei os joelhos. Aliás, uma das minhas memórias de infância mais vívidas é precisamente a de estar sentada em cima da bancada da cozinha, lavada em lágrimas, enquanto a minha mãe me tentava convencer a limpar o joelho esfolado com água oxigenada ('Isto não arde, Sara, a água oxigenada não arde nada!'). Fui o cliché da menina de boas notas a quem Educação Física sempre lhe estragou a média, que detestava as horas passadas no ginásio, que sempre teve medo de bolas a voar na sua proximidade, e que na hora de jogar fut-lata (don't ask) nos intervalos das aulas, queria ser sempre à baliza porque é o único sítio em campo onde estamos preparados para as bolas/latas que vêm contra nós e portanto o único sítio onde a defesa é possível. Na natação, sempre que havia corrida para ver quem fazia a piscina mais depressa, eu esperava pacientemente que todos arrancassem primeiro para não ter que ir a levar com os salpicos da água tumultuosa à minha volta. E, reparem, a minha infância não foi de florzinha de estufa; muito pelo contrário. Cresci na aldeia, muito do meu tempo livre foi passado na praia, horas a fim dentro do mar gelado da zona Oeste, a explorar os campos, o mini-rio que passa lá em baixo, a apanhar bichinhos da conta e centopeias e afins, a andar de bicicleta, tudo por sítios que ainda hoje penso que se tivesse acontecido alguma coisa estávamos lixados, que ninguém sabia por onde andávamos e na certa iam demorar muito a nos encontrar. Mas a minha integridade física imediata, essa, sempre foi resguardada com todas as minhas forças. 

No domingo, ao correr uma maratona, não foi diferente.

Desde que descobri que pessoas normais também corriam maratonas que sabia que um dia queria muito correr uma. Há mais de um ano que tinha decidido que iria correr esta de Lisboa e há mais de seis meses que me preparava fisicamente e especificamente para ela. Porque se descobri que pessoas normais podem correr maratonas, também descobri todo o tipo de coisas que acontecem frequentemente a pessoas que a acabam: mamilos ensanguentados nos homens pelo suor e fricção de quatro horas com a t-shirt, estragos a órgãos internos que fazem muito boa gente mijar sangue a seguir à prova, anemia durante meses pelo desgaste dos músculos e das reservas insuficientes de energia imediata do corpo, desfalecimento por hipoglicemia nos km finais ou no cruzar a meta, vómitos idem, unhas dos pés que caem, bolhas, assaduras diversas. Portanto, uma pessoa acabar uma maratona não é nada impossível, agora acabá-la saudavelmente já me parecia uma história completamente diferente. O meu espírito sonhador e o meu ultra-conservadorismo físico inato estavam portanto em choque.

Desde o início que tive a ambição de acabar a maratona nas 4 horas. 3h59, vá, para ser mais precisa. É um tempo tão aleatório como qualquer outro mas na minha cabeça - e na de muitos atletas amadores, sei - há um mundo de diferença entre fazer 4h01 ou fazer 3h59 (4h01 ou 4h29 já vai dar à mesma coisa, quase). Mas pronto, meti esse tempo na cabeça, que o inesperado record a 50'47 nos 10k de Londres em junho veio confirmar que me era possível fisicamente (o Mcmillan tem uma calculadora muito jeitosa e muito precisa em determinar que tempos são alcançáveis noutras distâncias, baseado no tempo que fizemos numa prova recente. A projeção do nosso tempo de maratona não é duplicar o nosso tempo de meia-maratona, por exemplo, é uma coisa mais exponencial do que aritmética). Comecei pois a treinar não só para acabar a maratona, mas também para a acabar dentro das 4 horas.

Isto pensava eu. Porque no fundo, no fundo, o meu afinco todo, o número mais elevado de treinos semanais do que seria necessário para garantir que acabasse a maratona, não foi para conseguir ir ao ritmo necessário para as sub-4h, mas sim para garantir sem sombra de dúvida que eu seria capaz de acabar os 42,195 km sem qualquer mazela. Isto percebo eu agora, em retrospetiva. Porque assim que comecei a correr no domingo, mandei o passo de 5min40/km ir dar uma volta ao bilhar grande que eu queria era sentir-me bem durante todo o caminho. Portanto desde o km 1 que eu sabia que não iria conseguir o meu objetivo de tempo. Nem sequer lutei por ele.

E aqui entra a minha natureza, de que eu já desconfiava e que se me afigurou claramente após ter cruzado a meta às 4h38: eu recusar-me-ei sempre a sacrificar a minha integridade física em prol da competitividade desportiva. Mesmo que essa competitividade seja apenas comigo mesma.

Porque a verdade é que eu nunca sofri durante a maratona. Fui sempre bem-humorada - o que nas provas é muito raro, fico com um feitio terrível - fui capaz de sorrir sempre para as fotos, para as pouquinhas pessoas que nos animaram durante o percurso, fui capaz de apreciar estar a correr na Marginal, ao lado do rio, sorrir ao ver a ponte 25 de Abril a assomar-se de repente no horizonte, não houve um momento em que tivesse pensado em desistir, e tirando o aborrecimento dos primeiros km que demoravam a passar, e o enjoo terrível que me deu nos últimos 2-3 km e que me impediu de finalizar forte como queria, tive uma prova santa. O tempo foi quase o ideal para correr - fresquinho, nublado durante quase todo o percurso - senti-me bem e bem-disposta, portanto nenhum fator externo que influenciasse negativamente a minha capacidade de dar o meu melhor. Apenas o meu ultra-conservadorismo no que toca à proteção do meu bem-estar, lá está. E foi precisamente esta retração muito inata de dar tudo que me estragou um bocado a alegria de ter realmente cruzado a meta e completado uma maratona. Não dei, e suspeito que nunca vou dar, o meu melhor nestas coisas.

Mas bom, a verdade é que a minha estratégia insconsciente defensiva garantiu que mazelas físicas nem vê-las, para além dos músculos doridos do dia a seguir: unhas dos pés todas inteiras, zero bolhas nos pés, zero assaduras, não mijei sangue!

Ora, posto a reflexão anterior, só há uma coisa a fazer: da próxima vez que quiser correr uma maratona sub-4h, tenho que treinar com o afinco e a velocidade que uma pessoa normal treinaria para uma maratona sub-3h30. Para garantir que o meu confortável já seria as tais sub-4h. Boa estratégia, hein? :D


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Voltando agora ao relato mais descritivo da prova:

Acordei às 6h da manhã com uma carga de água de meter medo ao pessoal que vive em países de monções. Não consegui dormir os 20 minutos que ainda faltavam para o despertador tocar por isso levantei-me e comecei o ritual de esfreganço com vaselina em todos os pontos que sabia atreitos a feridas de fricção: calcanhares, contorno do sutiã, elástico dos calções, virilhas, dedinhos dos pés um a um, pontos das pernas onde encosta a costura dos calções, etc. Comi o meu pão costumeiro de pequeno-almoço, sem nada porque os nervos não permitiram e muito lentamente, meti os géis na bolsinha do telemóvel, vesti a sweatshirt velha para me abrigar até ao tiro de partida, e lá parti com o meu pai para o hipódromo de Cascais. Fila demorada para a casa-de-banho, direcionamento para a zona dos sub-4h40 (e não é que acertei? :P), espera pelo tiro de partida. De repente abre-se o sol em todo o seu esplendor e eu começo a maldizer as projeções meteorológicas que davam céu nublado, aguaceiros e descida da temperatura por me terem dado uma falsa sensação de segurança. A coisa que me é mais insuportável na corrida é o sol/calor. Começámos a correr às voltas por Cascais e quando finalmente desaguamos na Marginal temos o sol mesmo de frente a bater nos olhos. Aaaaah, que agradável, ainda por cima estamos a correr em direção a leste, vai ser isto todo o caminho, que fixe. Isto aliado ao facto de serem os primeiros km e uma pessoa pensar que ainda nem um quarto da distância percorreu, de ir sozinha e de haver muito pouquinhas pessoas a apoiar, fez com que a primeira parte do percurso fosse chata para caraças. Não foi custosa - lá está, escolhi desde o início ir a um ritmo confortável - mas foi chata.


(peço desde já desculpa pelas marcas de água mas não me apetece dar 50 euros para poder usar fotos em condições) 
bem-humorada na primeira parte do percurso - até fazia fixes e sorria para as fotos, que coisa rara :)


Aí ao km 17 comecei a ver a Ponte 25 de Abril ao fundo, e fiquei muito contente. Iiiih, já via Lisboa! Mas sabia que ainda faltava uns 10 km até passar por debaixo dela, e pelo menos uns 5 ou 7 até chegar à capital propriamente dita. Que não me doesse a barriga até lá - literalmente - pensei eu.

No Dafundo, em vez de subirmos pela Marginal fomos direcionados pelo passeio mesmo à beirinha do rio, onde havia uma data de voluntários a segurar bandeiras de alguns países representados na maratona. Essa parte foi gira, até porque eles gritavam muitas palavras de incentivo, o que sabe sempre bem, e era mesmo à beirinha da água, foi agradável. Quase sem dar por isso entrei na reta ao pé do Aquário Vasco da Gama, uma velha amiga das anteriores meias-maratonas da ponte 25 de Abril e que ficou gravadinha na memória por ser a parte mais custosa desse percurso (nunca mais acaba, nunca mais chega a zona para virar, e enquanto a percorremos sabemos que temos que fazer aquilo tudo para trás ainda). Prometo nunca mais me queixar dela depois de a ter feito com 20 km em cima das pernas, em vez dos costumeiros 13, e de ainda ter mais de 20 para fazer, em vez dos costumeiros 5.


a tal parte muito ribeirinha, com as bandeiras de vários países

Quase à entrada de Belém, ao km 23, tive a maior surpresa do percurso: 3 colegas do grupo de corridas de Mafra que me reconheceram e me acompanharam um ou dois km na corrida, perguntando se estava bem, como estava a correr a prova até ali, como era com os géis, e se estava a planear acabar. Foi aí que disse em voz alta e por isso ficou assente: 'Agora já sei que acabo.' Só ainda não sabia era em que tempo. Estava-me a sentir bem, a entrada em Lisboa tinha-me dado um novo alento (agora já estávamos perto, porra, a meta era nesta localidade), e sabia que mesmo que tivesse que ir a andar o resto do caminho, as cerca de 4 horas que ainda me restavam até ao tempo limite da prova seriam suficientes. E foi assim que fiz este cálculo que me relaxei um bocadinho e dei permissão a mim mesma para caminhar nos abastecimentos enquanto bebia a água e tomava os últimos géis necessários.

Em Lisboa o aborrecimento já não foi nenhum porque à medida que ia passando sítios estratégicos ia ficando com a sensação de que a meta estava cada vez mais perto (e estava, como é óbvio, desde o primeiro km, né, mas isto do psicológico nem sempre bate certo com o factual). Torre de Belém, Mosteiro dos Jerónimos, Ponte 25 de Abril, Cais do Sodré, até que entrámos no Terreiro do Paço. E aqui foi a parte mais surreal de todo o percurso. Para fazer os míticos e certinhos 42195 metros, há que enfiar ali dois ou três quilómetros para dentro da cidade, que a estrada de Cascais ao Parque das Nações não chega exatamente. Daí que nós temos que subir até aos Restauradores e voltar para baixo novamente. Ora, a Baixa estava à pinha com turistas, como é normal a um domingo, e por isso foi muito estranho estar ali a correr no meio deles. Os domingueiros mal olhavam, a passear, entretidos a ver as montras e a entrar e a sair das lojas, quase me senti mal por estar ali a incomodar, a correr no meio da rua. E nunca foi mais nítido a distância entre nós e as pessoas ditas normais que aquele momento, a minha cabeça gritava 'Eu estou a correr uma maratona, eu vim a correr de Cascais até aqui, levo 32 km nas pernas, estou a viver um momento mítico, único, espetacular, mas o mundo continua a girar como se nada fosse!'. Banhinho de humilde, ajustamento das perspetivas, o que queiram. Fiquei feliz por voltar para perto do rio.


no Rossio, ainda com cara razoável


A zona de Xabregas é um bocado deprimente, mas como é a zona imediatamente antes do Parque das Nações, a zona da meta, passa-se bem. O meu coração deu um pulo grande quando o relógio marcou os 33 km, pois nunca tinha corrido mais do que isso e a partir dali era o desconhecido. Continuei a sentir-me bem, continuei a dar-me permissão para caminhar nos abastecimentos, ingeri o último gel, e comecei a contagem decrescente até aos 42. Verdade seja dita que eu vinha em contagem decrescente desde o km 4 ou assim, mas o momento em que se passa o km 32 é o momento em que passam a faltar só quilómetros de um dígito e é também o momento em que, se nos sentirmos razoavelmente - como era o caso - já sabemos que de uma maneira ou de outra vamos cruzar aquela meta. Mas a partir dali, de cada vez que recomeçava a correr após os abastecimentos sentia os gémeos a contrair, as minhas pernas começaram a gritar de dor (dor da normal, não de lesão, portanto suportável) cada vez mais alto. Lembro-me que houve três vezes em que me emocionei durante o percurso, em que me escorreu que era aquilo, eu estava ali a correr uma maratona, após tantos meses de ânsias, após tanto km sofrido em treino, após tantas vezes (mais para o final do programa de treinos, em que o esgotamento mental era tanto que receei pela minha sanidade mental) em que me apeteceu chorar só de saber que tinha que calçar os ténis para ir correr mais uns km, após gastar tanta energia mental e física a preparar-me para esta prova, finalmente, ali estava eu. Foi já perto dos 40 km que me deu o terceiro ataque de emoção, em que comecei mesmo de lábiozinho a tremer, soluços a irromperem pelo peito sem controlo, e lágrimas a marejar os olhos, ao mesmo tempo que pensava: 'Eh, Sara, calma, guarda a catarse para quando cruzares a meta.'


já no Parque das Nações, mesmo quase a chegar à meta, com cara de quem está concentrada a controlar o estômago revolto


A catarse não veio. A partir do km 39-40 o meu estômago a modos que enrolou e os saltos que a corrida envolve tornaram-se insuportáveis para o enjoo que se seguiu. Comecei-me a irritar porque queria acabar de forma forte, a correr a miséria de metros que faltavam e não estava a conseguir. E ainda por cima as pessoas tinham saído à rua em força ali! A Av. D. João II estava apinhada de gente de um lado e do outro, tudo a gritar por nós, 'força, está mesmo QUASE!', e eu a caminhar sorumbática com um estômago que tinha desistido de ser estômago ou estava em negação, ou assim. Avisto a meta, mais de 4 horas e meia depois de ter começado a correr, há uma vida, em Cascais, e recomeço a correr devagarinho. Estômago cooperante ou não, cruzar a meta com honra ninguém me tira, pensei eu, enquanto me preparava para erguer os braços em posição triunfal, pouco condizente como eu me sentia. 

Recolhi a minha medalha, sorri à minha mãe e madrinha que gritaram por mim na meta, e espalhou-se o enjoo por mim afora, contente por agora já estar à vontade para reinar. Sentei-me no chão, nauseada e sorumbática e olhar as outras pessoas a cruzar a meta e a pensar para mim: 'Nunca, mas mesmo NUNCA mais me meto numa coisa destas.' E foi só um enjoozinho no final, que durou umas boas horas mas ainda assim. Caguinchas ou não?

A minha primeira maratona teve portanto este sabor agridoce de saber que a acabei e ter a noção de que só isso é coisa para me orgulhar, mas não ser capaz de sentir verdadeiro orgulho porque fiquei bem aquém do objetivo temporal que tinha ambicionado. Não houve catarse no final. Sei que não dei o melhor que podia ter dado. Desconfio que só vou realmente apreciar a distância que percorri quando voltar às distâncias mais curtas e elas me voltarem a parecer enormes. Ou quando conseguir apreciar o facto de que ainda nem há dois anos me estava a inscrever na minha primeira prova - 10 km na São Silvestre dos Olivais - e que nem sabia se a iria conseguir acabar. E agora acabei de fazer mais do quádruplo.




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Entretanto, coisas que aprendi sobre mim para corridas futuras:

- não posso fazer planos de treino de mais de 16 semanas a correr 6 vezes por semana. Nas últimas semanas abate-se-me um esgotamento tão grande que nem olhar para os ténis consigo. Nem tenho garantias que essa quantidade toda me tenha feito correr melhor/ mais rápido. Talvez tenha garantido que não sofresse durante uma maratona nem ficasse com mazelas, mas para os meus próximos objetivos - que não passam por correr mais maratonas a curto prazo - não serve. Planos mais curtos e com menos treinos semanais mas de qualidade serão a minha próxima aposta.

- as minhas projeções de tempo têm que se tornar mais realistas. Sabendo como sei que sou naturalmente avessa a sacrifícios e que nunca darei tudo o que tenho numa corrida, tenho que me certificar que o que tenho é muito superior do que o que é preciso para atingir o objetivo que tracei.

- relacionado com o ponto anterior: o meu ritmo em treinos tem que estar mais próximo do ritmo que quero correr em prova. O meu corpo e mente precisam de mais certificados do que o corredor normal de que conseguem correr a um determinado ritmo e mantê-lo durante muitos km. Têm que saber que não lhes vai acontecer nada de mal se se sentirem desconfortáveis durante umas horas, a sobrevivência não está em risco, sim? 

- tenho que deixar de ser tão conservadora no início das provas. Uma coisa é arrancar a mil à hora por causa da emoção da partida e depois rebentar a meio; outra é partir tão abaixo do que somos capazes com medo de nos sentirmos mal lá mais para a frente. Não posso prever como me vou sentir lá mais para a frente. E se me sentir a esgotar, abrando - já que acabo sempre por abrandar de qualquer das formas.

- só quero voltar a correr uma maratona quando estiver segura de que a consigo acabar abaixo das 4 horas. Por tudo o que referi, isto é coisa para levar uns aninhos. Focar-me nas meias para me tornar uma corredora mais rápida no geral e deixar os treinos longos de 30 km afastados durante muuuuuito tempo.

- no dia em que correr uma maratona em 3h44m59s será o dia em que terei entrada direta na Maratona de Londres e a razão pela qual eu não vou desistir de me tornar mais rápida. Um passo de cada vez, Sara, um passo de cada vez.

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Quanto mais penso no que fiz no domingo, mais orgulho sinto no meu corpo. Não em mim, mas no meu corpo. Ele portou-se à altura, carregou-me durante 42 km quase sem nenhum queixume (ainda estou um bocadinho aborrecida com o estômago, mas podia ter sido bem pior. Podia ter enrolado aos 15 ou 20 km e aí eu não tinha acabado de certeza), e já está quase pronto para outra. Aprendeu com o stress todo que lhe mandei para cima durante estes meses, evoluiu em conteúdo e especialmente em forma - tenho uns músculos definidos e rijos nas pernas como nunca sonhei, e estou à beira de ganhar abdominais! - e nunca se revoltou muito. Lembro-me de nos dias anteriores à corrida pensar muitas vezes em como o meu corpo nem sonhava com o que lhe ia fazer no domingo, nem sonhava com o que aí vinha, e quase sentir que o estava a trair de certa forma, já que as duas semanas precedentes são de redução drástica no volume e intensidade do treino. Se calhar pensava que o pior já tinha passado, coitadinho. Mal sabia ele :). E apesar disso portou-se à altura. 

Ouviste, senhora mente? Põe os olhinhos aqui no senhor corpo. 







S.