quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Tempo belga: 2 D.S.: 0

Meu querido chapéu azul das doze estrelas amarelas:

Vivemos um ano muito feliz, eu e tu. Acompanhaste-me sempre na mala, todos os dias, a fornecer-me a força e confiança necessária para caminhar debaixo de chuva interminável. Foste-me oferecido com muito carinho e no auge da minha paixão por todas as coisas união-europeanas. Ao início até andava cheia de tristeza por o inverno lisboeta de 2011-2012 ter sido tão seco e nunca me dar oportunidade de te usar. Por isso foi com muita alegria que vim viver para o paraíso do aguaceiro. 

A tua flexibilidade sempre me maravilhou. Cabías na minha mala mais pequena mas não eras como os outros chapéus desdobráveis; não senhora. Eras resistente, abanavas muito essas varetas mas nunca nenhuma se partia e, entretanto, eu também aprendi a jogar ao chapéu-de-chuva-e-vento.  Afastaste água, neve e granizo, incluindo aquele temporal de pedras de gelo que nunca mais vou esquecer e que até deu ao céu uma cor meio roxa, muito assustador. Nunca mais fechaste muito bem, mas isso estou em crer que se devia à tua felicidade em me proteger da chuva, mais do que ao teu historial de lutas contra a ventania bruxelense e contra a precipitação do demo. Foste um fiel companheiro nas viagens deste ano louco, e mais do que uma vez voltei atrás para te salvar de um esquecimento que quase era completo.

Mas ontem a ventania foi forte demais. Nem o melhor do chapéus rijos aguentaria aquilo, e tu eras melhor que muitos desses. Eras o melhor dos chapéus. Sei que parei no meio do passeio  porque o vento nos impediu de progredir e agarrei-me com força a ti, na esperança que fosses também o mais bravo dos chapéus e te aguentasses, mas depressa descobri que era em vão. Saltou-te uma vareta, saltou-te duas, e eu pensei "Olha, já foi", enquanto continuava de pé fincado e a fazer força para não ser arrastada para o meio da estrada. Ainda te tentei abrir, como se nada fosse, mas tinhas a asa partida. Tentei concertar-te, mas estava para lá de arranjo. Despedi-me de ti.

Foste um bom chapéu. Só quero que o teu sucessor tenha metade da tua força e aguente metade do que tu aguentaste. Conseguindo-o, já será um grande chapéu.

Um adeus do fundo do meu coração partido,

S. 






P.S. - Isto foi para eu não me armar em esperta a gozar com a queda do Napoleão. Ninguém goza com o tempo belga e sai impune.

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