quinta-feira, 27 de junho de 2013

Minimalismo: nível IV - continuação

Desde que abri os olhos para os grupos de venda de coisas em segunda-mão que passei a olhar para compras de outra maneira. Percebo cada vez menos a vantagem de comprar novo, de entrar em lojas para ver que novidades há, de gastar o triplo para ter o prazer de estrear algo (eu sou muito, muito, muito, muito forreta. Mas muito.) As minhas montras são neste momento dois ou três grupos de Facebook de roupa em segunda mão aqui em Bruxelas, e mais dois ou três de móveis/acessórios/afins também já usados. Na altura que os descobri tinha era pena de ter já feito a triagem em Portugal e tudo o que tinha cá ser apenas o mínimo. Andei a observar tudo o que aqui está que era nosso (a casa foi alugada já mobilada, portanto, tirando roupa, não era muito) com o olhar impiedoso de quem abomina o desperdício e o hoarding para ver se algo estava acima da linha do mínimo*. Sem sucesso.

Entretanto passou um ano. A perspetiva de mudança para um estúdio sem armários está a implicar muitos cálculos de cabeça sobre até onde pode ir um armário de três portas versus uma casa pequenina, mais a tralha roupal de duas criaturas humanas. O total deu: não vai muito longe.

Por isso, numa espécie de fúria minimalista e anti-material, despejei o meu roupeiro em cima da cama e botei olho implacável novamente sobre tudo o que era meu. O resultado foi um saco azul de Ikea a abarrotar pelas costuras e quase metade dos sapatos fora. Fora, salvo seja, porque decidi dar uma segunda oportunidade a toda a roupinha boazita e uploadá-la nos benditos Facebooks de segunda mão. 
   



Já vendi umas coisas - mais do que estava à espera, para dizer a verdade - e estou a fazer figas para que mais algumas lhes sigam o caminho. Daqui a uns dias, o que restar vai direitinho às Oxfams desta terra (onde também já lá comprei roupa). 

Não esqueço o alívio que foi arrumar de volta no roupeiro apenas as coisas que realmente uso e vê-lo tão limpinho e leve. Entretanto o alívio desvaneceu-se quando vi que duas malas grandes não chegaram para arrumar toda a minha tralha tecidal, mas penso sempre pelo meio do desânimo que podia ser pior, três podiam não ter chegado. 

Gosto muito de saber que as nossas mudanças se fazem de um dia para o outro, literalmente, e que raízes não as criamos em lado nenhum, e voar é sempre que apeteça. Materialmente falando, estamos desprendidos de Bruxelas, como estávamos de Portugal, como estivemos de Londres. E agora siga para outro canto da cidade.



S.


* Se bem que, defina-se "mínimo". Temos cá duas mantas que não devem ter custado mais de 5 libras na Primark mas que nos andam a seguir pela Europa fora há três anos... Porquê, não sei bem. São mesmo muito fofinhas, macias, e gostava de dizer que cheiram a casa para isto ficar mais sentimental mas não cheiram; quando muito cheiram a amaciador nos dias imediatamente a seguir a serem lavadas. E por falar em amaciador, há um, o Comfort azul, cujo cheiro nos despoleta a memória de quando começámos a viver juntos em Londres e esse sim, tem cheiro a casa. Mas cá não há, portanto as mantas não cheiram a casa. A última vez que fomos a Londres - e abençoado comboio sem a mariquice dos líquidos - a única coisa que trouxemos da cidade como prenda foi uma embalagem de Comfort azul comprada numa Boots qualquer. É este o nosso nível de loucura pelo dito detergente. 

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