quarta-feira, 12 de junho de 2013

Os humoristas andam originais

E por falar em notícias que consistem em imagens grotescas de comida: a oposição na Austrália organizou um jantar e colocou no menu as mamas pequenas e as coxas grandes da primeira-ministra, Julia Gillard.


Espetacular, hã? Dar a um prato o nome de partes do corpo de uma oponente. Só classe. (Notícia aqui)

Claro que, sendo isto revoltante, não é inédito nem devia ser tão surpreendente. Julia Gillard tem um defeito que é ser uma mulher com poder. E as armas de arremesso preferidas contra mulheres no poder (ou contra qualquer mulher, agora que penso melhor) são insultos à aparência. Acho que é um reflexo inconsciente do que nos foi incutido durante a primeira infância, quando contrariados atirávamos à cara da menina que nos estava a chatear seriamente aquele insulto muito demolidor de recreio de infantário de "és feia!". Exceto que a coisa não pára no infantário, continua antes pela vida. Qualquer revista e blog cor-de-rosa o atesta.

Mas o que é mais interessante é como o insulto continua a ser atirado mesmo contra mulheres poderosíssimas, que alcançaram cargos de topo nos países respetivos, e que ainda assim não merecem mais que um "és feia!", "és gorda!", "és velha!", "és mal feita!". Estas mulheres singraram altamente num meio ainda extremamente dominado por homens mas isso pouco parece importar ao lado dos seus falhanços na maior aspiração e papel da mulher: ser bonita. Contem quantas vezes o Ricardo Araújo Pereira, o Bruno Nogueira e o Nilton colocam o adjetivo "gorda" na mesma frase que Merkel. Ou o frenesim que se gerou quando Hillary Clinton apareceu sem maquilhagem algumas vezes e sem cabelo arranjado (acusaram-na imediatamente de estar a descurar os seus deveres como Secretária de Estado. Ao que ela respondeu qualquer coisa como "Oh meninos, eu cheguei a um ponto na minha carreira em que me posso dar ao luxo de me estar a marimbar para se pinto os olhos ou não. O meu título fala mais que todo o meu guarda-vestidos junto." Pimba, calou.)

O que é verdadeiramente preocupante neste caso da Julia Gillard é a escolha da comparação: coxas e peito, duas partes do corpo feminino extremamente sexualizadas. Ou seja, o insulto aqui dá um passo a mais no sexismo dos "és gorda" e "és feia" para passar a ser "és um objeto sexual, para ser olhada, avaliada [o "mamas pequenas e coxas grandes"] e comida". A alusão à violação como forma de silenciar uma mulher e de a submeter à vontade do seu oponente a permear toda esta brincadeira oh-tão-sofisticada. 

Por isso, refletides: da próxima vez que quiserem insultar a Merkel através do seu peso corporal, pensem "E se fosse o Berlusconi, também o chamaria de gordo?" (nunca ouvi ninguém chamá-lo de tal). Aposto que muitas outras infâmias surgiriam à frente na lista de insultos ao palhaço. De modo que chamando "gorda" à Merkel mas "palhaço" ao Berlusconi, tendo os dois senhores relativamente a mesma massa corporal, sim, seria sexista. Sede originais.





S.   

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