terça-feira, 29 de abril de 2014

O canal, a fronteira e a falésia

Ando há uns dias com este post às voltas sem saber por onde o começar. Uma viagem que andava há anos a sonhar fazer e que finalmente foi feita. Foram precisos uns dias para apurar o que realmente penso dela, daí o post em rodopio mental.
 
Gosto muito de fronteiras. Mesmo muito. Tanto as geográficas, como as políticas, como as culturais ou de mentalidade. Sem esquecer as nacionais, que nem sempre correspondem às outras três.
 
O Canal da Mancha é um daqueles sítios que reúne os quatro tipos num só.
 
E abro aqui um parênteses para falar do nome. Canal da Mancha para os portugueses, Canal de la Manche para os franceses, English Channel para os ingleses. Ai, apropriações. É tão English quanto français, ora. Como a companhia aérea espanhola se chamar Iberia. Da Ibéria somos nós também, oh espanhóis. Diz a Wikipédia que a palavra "Mancha" em português nem sequer é tradução da "Manche" francesa, já que "manche" é "manga" e "mancha" é, bom, nódoa. Enfim, falsos amigos nas traduções. Fechar parênteses.
 
O meu fascínio pelo Canal da Mancha está por isso ligado ao meu fascínio por fronteiras. E ele é-o em muitos sentidos da palavra. Fascínio redobrado quando descobri que do lado inglês, perto de Dover e portanto na parte mais estreita do Canal, há uma maravilha natural apelidada de "the white cliffs of Dover" e que impressiona bastante quem chega a Inglaterra pelo mar.
 


 
Não desapontaram, ainda que só as tenhamos visto quando abandonávamos a ilha, ao invés de quando chegássemos, como esperava, e apesar do tempo feio e terrível. Tempo que serviu para não nos esquecermos do significado de "norte" em Mar do Norte, de que pelos vistos Bruxelas anda esquecida, mas Dover e Calais não.
 
Viajámos de Bruxelas até Calais, o nosso ponto de travessia em França, e no qual começam a manifestar-se os tiques de fronteira.
 
Eu pensava que não havia controlo tão apertado como numa travessia de fronteira pelo ar e afinal enganei-me.
 
Começou logo no Eurostar. Comboio que leva gente de Bruxelas para Londres, mas que também leva gente de Bruxelas para Lille e Calais, significa levar pessoas que vão atravessar uma fronteira e pessoas que não vão atravessar uma fronteira. Para as primeiras, há check-in especial com controlo de passaporte antes de embarcar. Para as segundas, não há controlo e o check-in para o comboio até é noutro sítio. Ora o que é que acontece: para estas segundas, as que não mostraram passaporte, há uma carruagem reservada e não se pode sair de lá. Literalmente. Tínhamos dois seguranças na carruagem para impedir que circulássemos pelo comboio. Fomos comprar uma sandes ao bar do comboio escoltadas por um guarda fronteiriço, para nos impedir de misturar com o pessoal que sairia no UK. À saída em Calais, os guardas impediram que circulassemos na plataforma até que o Eurostar fechasse as portas e se pusesse a andar em direção a Londres. Foi uma das experiência mais bizarras que já tive.
 
Depois é o porto de Calais. Um complexo enorme, cheio de sinalização complicada de para onde vai o quê e extremamente bem guardado de forma a ninguém poder escapar por entre a teia sem ser identificado. As zonas de embarque de carros e camiões, com portagens para controlo de todo o passageiro e de tudo o que (e se alguém) vai nos veículos. A casinha de embarque para os passageiros a pé, como nós. Os autocarros para nos levarem até à entrada do ferry. O mostra BI, arruma BI, mostra mala, tira casaco, tira cinto, apita, apalpadela, culpado até provar inocente costumeiro dos aeroportos. Posso-me queixar rezingona da chatice disto tudo e do leve aborrecimento que nos traz, sim senhora. Mas não nos escapou do campo de visão o acampamento desumano, mesmo às portas do porto, de imigrantes sem documentos que tentam dar o salto para o UK e não conseguem. De repente o pedaço de plástico azul que tenho na carteira afigura-se-me valoizíssimo, e ganha-se a sensação perturbante de nada ter feito para o merecer, apenas ter tido a sorte incrivelmente aleatória de nascer no sítio certo do mundo. Recalibrar perspetivas torna os aborrecimentos comezinhos em birras ridículas.
 
E de repente estamos no barco que não parece um barco mas sim um aeroporto flutuante (aquilo tem lojas duty free. Desculpem se nunca fiz um cruzeiro mas eu não estou habituada a que os meus transportes marítimos tenham lojas duty free. E vários restaurantes). Eu, que esperava um ferry como o de Tróia, ou os do Algarve para se ir até à Armona e similares, ou os que fazem a travessia do Tejo, tive um brilhante choque ao embarcar naquele monstro. Nada de deck ao ar livre, nada de olhos presos no horizonte tentando descortinar a costa inglesa e as falésias brancas assim que aparecessem (com o nevoeiro que estava, se as víssemos ao atracar no porto de Dover já seria com muita sorte. Que foi o que acabou por acontecer).
 
Chegámos a Inglaterra, quando duas horas antes estávamos em França, quando três horas antes estávamos na Bélgica. Agradeci muito sentidamente e mais uma vez à minha cidade de acolhimento que tão mal trato a sua centralidade geográfica e por me permitir concretizar sonhos sem ter que me enfiar num avião, essa espécie de máquina teletransportadora que tira a piada toda à viagem, ao movimento de atravessar qualquer coisa, e que o ferry do Canal da Mancha protagoniza tão bem.
 
Inglaterra anda-se a tornar mais familiar do que inspiradora de fascínio pelo que muito pouco tenho a dizer sobre Dover em si. Só louvar o castelo, enorme, e com visitas guiadas pelos túneis utilizados durante a Segunda Guerra Mundial para defender a Inglaterra no seu ponto mais próximo do Continente e, portanto, mais vulnerável. A maneira como os ingleses tornam inesquecível e multi-sensorial qualquer visita aos seus monumentos históricos, essa, ainda não cessou de me fascinar.

Não me escapou também o uso indiscriminado e simultâneo de libras e euros nos ferries, mais um sinal prático e simbólico da sua especial função de atravessar fronteiras.





S.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

terça-feira, 22 de abril de 2014

Comida confortável de conforto

Deslargai tudo o que estaides a fazer e ide fazer isto a correr: panquecas de banana e ovo. DAQUI.
 
A sério, é divinal. E melhor que tudo, ultra fácil. Esmagar uma banana e misturar com um ovo. Despejar na frigideira e deixar fritar como se fosse para fazer uma panqueca.
 
Nunca me tinha ocorrido fazer crepes/panquecas sem farinha ou leite. E não é que dá?! Fica um cruzamento entre um crepe e uma omelete mas que sabe a banana. Puf, nas papilas gustativas.
 
Pode-se comer só assim ou pode-se misturar o que apetecer. Eu fiz uma com mirtilos, como na receita original, e outra com queijo brie (mas não). Não há fotos porque a alarvice foi muita e eu ainda não dominei a técnica de virar estas panquecas mais fofas. A foto do blog original está mais que boa.

O que é que deve combinar mesmo bem com estas panquecas de banana? Nutella, claro, a anti-matéria da banana. Mas eu tomei a decisão consciente de não ter Nutella em casa: eu simplesmente não consigo não abusar de Nutella, áquele ponto de ficar tão enjoada que já nem consigo desfrutar do chocolate avelaneiro maravilhoso. É muito triste. Mas ide, provai e sede felizes, se tiverdes mais auto-controlo do que eu.




S.

domingo, 20 de abril de 2014

Ele há coisas... #43

Na Place Flagey, uma das praças mais conhecidas aqui do burgo, encontra-se isto:



Fixe, hein?
 
Na foto não se nota bem mas diz "Minha Pátria é a Língua Portuguesa", com o nome dele e data de nascimento e morte.
 
Aquilo está a ser remodelado e por agora tem aquelas barreiras azuis e amarelas feias à volta da estátua. Não dá para aproximar. Mas ao que consta, a zona da estátua é uma praceta gira, costuma haver ali banquinhos e tudo.




S.

Igualdade sem idolatrias

O John Stuart Mill é um filósofo fantástico. Como são fantásticas as pessoas que defendem causas das quais não podem tirar proveito próprio.
 
Defendia a liberdade, como vários pensadores seus contemporâneos, mas ao contrário de quase todos estes, ao Stuart Mill não lhe escapou que metade da população vivia num estado de escravidão legal. O seu ensaio "The Subjection of Women" é incrível pela lucidez, racionalidade e serenidade com que defende a liberdade das mulheres e a igualdade entre os sexos.
 
Eu ainda não o acabei, mas já sei que a parte mais extraordinária já a li.
 
Sabem aquelas odes que de vez em quando surgem a exaltar as qualidades "intrínsecas" das mulheres? Ai que as mulheres têm uma força qualquer especial, ai que as mulheres são como um anjo e iluminam tudo o que tocam, ai que as mulheres são fadas, ai que as mulheres são amor, ai que as mulheres são deusas, ai que as mulheres são a perfeição em pessoa. Normalmente nestas odes o sujeito até surge como "a mulher", assim no singular para enfatizar ainda mais a essência de que todos os seres humanos do sexo feminino partilham. Estas exaltações da suposta essência superior feminina irritam-me quase tanto como sexismo descarado. E nem é pouco frequente que andem de mãos dadas. Quando uma mulher não se comporta como esta fada angelical cheia de amor auto-sacrificador da ode é fácil ser vilipendiada por estes pseudo-adoradores da essência feminina. Já dizia a outra (a Gloria Steinem), um pedestal é tanto uma prisão como qualquer espaço pequeno e fechado.
 
Ora, o Stuart Mill está no lado oposto disto. Ele fala desses exaltadores da mulher e de como a sua retórica está oposta ao seu tratamento delas:
 
"(...) é-nos dito perpetuamente que as mulheres são melhores do que os homens, por aqueles totalmente opostos a tratarem-nas como se elas fossem assim tão boas; e por isso esse dito tornou-se numa hipocrisia aborrecida, com a intenção de colocar uma face elogiosa sobre um insulto (...)"
 
"(...) we are perpetually told that women are better than men, by those who are totally opposed to treating them as if they were as good; so that saying has passed into a piece of tiresome cant, intended to put a complimentary face upon an injury (...)"
 
E ele continua:
 
"Se as mulheres são melhores do que os homens em alguma coisa, é seguramente no sacrifício individual por aqueles que pertencem à sua família. Mas eu ponho pouco ênfase nisto, enquanto elas forem ensinadas universalmente que nascem e são criadas para o auto-sacrifício. Acredito que a igualdade de direitos esbateria esta abnegação exagerada que é o presente ideal artificial do caráter feminino, e que uma boa mulher não seria mais auto-sacrificadora do que o melhor dos homens: -"
 
"If women are better than men in anything, it surely is in individual self-sacrifice for those of their own family. But I lay little stress on this, so long as they are universally taught that they are born and created for self-sacrifice. I believe that equality of rights would abate the exaggerated self-abnegation which is the present artificial ideal of feminine character, and that a good woman would not be more self-sacrificing than the best man: -"
 
E até vê nisto um potencial melhoramento dos homens:
 
"- mas por outro lado, os homens seriam muito menos egoístas e mais auto-sacrificadores do que atualmente, uma vez que não seriam mais ensinados a idolatrar a sua própria vontade como uma tão coisa grandiosa que seja realmente a lei para outro ser racional [aqui ele refere-se aos poderes de chefe que a lei do séc. XIX conferia ao homem casado sobre a sua mulher]."
 
"- but on the other hand, men would be much more unselfish and self-sacrificing than at present, because they would no longer be taught to worship their own will as such a grand thing that it is actually the law for another rational being."
 
Não há um pingo de idolatria por uma suposta essência feminina. Ele não o diz com todas as letras, nem tinha que o dizer porque não faz parte do tema da obra, mas acho que ele não acreditava que houvesse sequer uma essência feminina, visto que as características das mulheres do seu tempo se deviam à sua condição de escravas, e não a características intrínsecas do sexo feminino. A inabalável convição e defesa da igualdade das capacidades racionais das mulheres é até francamente surpreendente num filósofo que viveu em meados do séc. XIX.




S.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Já só faltam 21 (II)

Ontem encontrei uma Londres cheia de sol, pessoas e um grande sorriso amigo.
 
Também encontrei isto:


Uma meta maratonista ali mesmo em frente ao palácio.
 
Juro que não fiz de propósito. Só lá fui apanhar o comboio para casa.
 
É capaz de não ter sido coincidência, mas foi a primeira vez que admiti que um dia vou correr uma maratona. Foi em voz alta, para outra pessoa, por isso agora é real.
 
Pronto, era só isto.




S.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Aprende, só vou explicar uma vez

Viajar na Ryanair continua a ser a experiência bizarra que sempre foi. Isto porque eles continuam a adicionar bizarrarias.

A novidade agora é a segurança. Os assistentes de bordo fartaram-se – com razão, diga-se de passagem - de atuar para o boneco por isso agora as demonstrações de segurança ao início requerem a nossa “complete and undivided attention”. Mas pronto, isto sempre disseram eles, não é? O detalhe novo é que agora estão mesmo a falar a sério.

Proibido usar auscultadores durante a demonstração, proibido falar durante a demonstração. Eles interrompem para mandar calar. A assistente de bordo ralhou com as passageiras no banco da frente, carregou num botão para interromper a gravação com as instruções da demonstração, fez-lhes “Sssssssssssssssssssh” quando não paravam e todo o avião se calou em estupefação. Senti-me de volta à escola primária. Acho que isto deve ser muito recente.

Explicam também com muita seriedade os procedimentos de emergêncica a quem vai nas filas das saídas de emergência, coisa que nunca vi outra companhia fazer. Uma vez fui sentada aí e gostei muito. Gosto de me sentir parte das coisas.

Tudo isto faz desconfiar do verdadeiro motivo de tanto zelo pela segurança. Se há coisa que a Ryanair faz é sempre o mínimo que se tem que fazer, não mais. Será que há razão para temer este novo excesso de zelo? Sabem eles alguma coisa que nós não sabemos? Andarão aqueles aviões tão maus que o melhor é mesmo apostar na educação na fatalidade, já que as probabilidades da fatalidade aumentaram? Aaah, Ryanair, obrigada pelo exercício mental logo pela manhã.





S.

"You're so dark but I want you hard"

Escrevo num comboio algures nas Midlands. Vou visitar a minha futura potencial casa.
 
Sinceramente ainda não sei ao certo qual foi a minha ideia em meter-me nesta viagem. Decerto que a beleza ou fealdade de uma cidade não deveriam ser critérios prioritários na escolha da universidade para se estudar. Mas a viagem foi pensada numa altura em que a angústia da escolha que brevemente terei que fazer estava a pesar especialmente e, por isso, cá estou eu. Sendo o resto igual, pode ser que a beleza seja um bom critério de desempate. E qualquer pretexto para voltar à Inglaterra é sempre bom.
 
Isto faz-me lembrar que amo comboios. Se pudesse não trabalhava a partir de casa, trabalhava a partir de comboios. Metia-me num comboio qualquer e, ala por essa Europa fora. Era capaz de sair um bocado caro, ao fim do mês, mas provavelmente nem tanto como alugar um escritório. E a vista móvel compensaria grandemente.
 
Ainda não tenho a certeza absoluta de que mudar-me para Inglaterra seja a melhor coisa a fazer. Tenho um fascínio enorme por este país, misturado com muito carinho, mas ele tem coisas que me irritam profundamente. A mania de que não é Europa é a maior. Seria extremamente irónico para uma europeia convicta vir estudar coisas europeias para um país que parece estar a descascar a sua europeanidade aos poucos. Se os Tories vencerem as eleições para o ano e no referendo de 2017 os britânicos abandonarem a UE, não sei como vou reconciliar as minhas duas paixões. Se a Escócia se for embora em setembro então seria o cúmulo. A Inglaterra a resvalar cada vez mais para a periferia, cada vez mais isolada. Burros do caraças. O “orgulhosamente sós” não vos serviria, acreditem.
 
Viver em Bruxelas tem muitas desvantagens e eu nunca me cansei de as enumerar, muitas vezez com lamúria desnecessária. Mas se há coisa que soa incrivelmente a privilégio em viver nesta cidade é a centralidade. Não só por ser o centro político europeu e tudo o que isso gera, mas por estar no centro geográfico da Europa. Ter tanta cidade a uma hora de avião, ter mais ainda a duas, e ter umas consideráveis a duas horas de comboio, incluindo Londres, Paris e Amesterdão. É uma sortuda geográfica, a cidade.
 
A geografia influencia muito do resto, claro, incluindo história, fronteiras, mentalidade e relações. As fronteiras belgas não existem fisicamente há mais de 20 anos, como no resto da Europa, mas também não existem mentalmente. É tão fácil e tão perto ir ali a França, ir ali à Alemanha, ir ali ao Luxemburgo, ir ali à Holanda. Lembro-me de na viagem que fiz para Estrasburgo, uma rota quase reta para sul de comboio, ter tido que desativar as mensagens automáticas de roaming porque o meu telemóvel parecia um alarme, sempre a apitar com info “Chegou à Alemanha! Chamadas custam X, mensagens custam Y.”, “Chegou à França! Chamadas custam X, mensagens custam Y.”, e depois as fronteiras não são retas, enquanto a rota ferroviária é, por isso o comboio estava sempre a entrar e a sair desses dois países. A geografia está-se bem marimbando para as decisões humanas políticas e por isso aqui eu aprendi a fluidez das nações e senti-me sempre na Europa, onde quer que tenha ido. E isso foi mesmo fixe.
 
Por isso voltar à ilha será voltar à periferia, tanto geográfica como mental. E isso deixa-me um bocado desconfortável.
 
Voltar à Inglaterra é também um bocado triste por razões linguísticas. Vivendo no continente tem-se sempre a língua materna, a língua franca internacional e a língua do país hospedeiro com que lidar. E ainda que eu não tenha dado a atenção e cultivado o meu francês como seria suposto, e ir embora da Bélgica com a vergonha linguística que cabe a alguém que viveu aqui dois anos e meio e não consegue ter uma conversa prolongada em francês, gostei muito de ter tido que lidar com uma língua estrangeira que não o inglês. Voltar à Inglaterra será voltar a ser preguiçosa linguisticamente. Não sei como vou gerir este regresso à zona de conforto com a minha curiosidade cultural e linguística para com o resto da Europa (a última tentativa, com o alemão, não correu assim tão bem). Talvez o futuro daqui a uns anos me lance outra vez para a mainland. De preferência, de comboio.

 
 
 
 
S.        

quinta-feira, 10 de abril de 2014

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Quebrar glass-ceilings, um de cada vez

Por falar em pressupostos.
 
No domingo corri a Corrida dos Sinos, uma corrida em plena terra natal, com companhia, por uma estrada que conheço como a palma da minha mão. Esta era uma corrida que eu costumava ver passar todos os anos, desde que me lembro de mim, e olhava os seus atletas com um misto de admiração por serem capazes de correr tantos quilómetros, pena porque aquilo era gente que só podia ir em sofrimento, e assombro por claramente haver tanto maluco e deixarem-nos ali à solta, a correr, ainda por cima.
 
Aquilo há duas provas em simultâneo e os 3 primeiros quilómetros de trajeto são iguais. Há a dos Sinos, de 15 km, e a dos Sininhos, de 6, na qual muitas pessoas vão a caminhar. Quando me dirigi ao balcão para levantar o dorsal da prova, levei com a observação seca de "Isto aqui é para os Sinos" do simpático senhor que estava a distribuir os envelopes para a corrida dos 15 km. Certo. E as meninas pequeninas, podem participar ou isto é só para os homens grandes?
 
Como coincidência, recebi um panfleto no dia da corrida com algumas curiosidades sobre o atletismo e o 25 de abril. De como as provas eram proibidas durante o Estado Novo (é realmente um ajuntamento com algumas semelhanças aos motins, especialmente no arfamento e na passada rápida), e de como as mulheres particularmente eram desencorajadas a correr, visto que era uma coisa muito pouco feminina (a teoria da mulher como objeto para ser admirado/possuído e não como sujeito, explicada n'O Segundo Sexo, assenta aqui que nem uma luva). O panfleto explicava depois como tinham surgido os primeiros grupos de atletismo em Mafra e, consequentemente, esta corrida emblemática.   
 
No outro dia, enquanto deambulava pela Internet fora à procura da próxima sessão de masoquismo corrida, descobri os 20 km de Bruxelas. É um percurso espetacular, que passa por vários sítios icónicos aqui do burgo, e grande parte deles são meus percursos habituais de treino. Seria a minha última oportunidade de participar numa corrida aqui na Bélgica, e, não fosse dar-se o caso de aquilo calhar num domingo de manhã após uma semana de trabalho intensivo fora do país, seria perfeito. Mas o cansaço antecipado dessa semana é um grande travão no meu entusiasmo por isso a corrida estava já a modos que descartada.
 
Até que uma coisa me chamou a atenção:



Que desequilíbrios são estes?! Onde estão as meia-maratonistas?? A decisão foi imediata. Pois se o percurso familiar não chegar para o sacrifício, a vontade de contribuir para desconstruir pressupostos servirá. 




S.

Senhora e senhor

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Já é a segunda vez que vou à caixa de correio buscar um envelope da Igreja das Testemunhas de Jeová aqui da zona. É um daqueles panfletos de publicidade ("Venha connosco celebrar a morte de Jesus!") mas o especial é que vem dentro de um envelope endereçado à "Família X". Já é a segunda vez que me enganam porque fico sempre entusiasmada a pensar em quem nos terá escrito. Não sei se o que me irrita mais é ter publicidade religiosa camuflada na minha caixa de correio se é que ela venha sempre endereçada ao apelido do macho da casa. Nós somos uma família, sim, mas temos um apelido cada um e na caixa do correio eles figuram os dois. Ou endereçam aos dois apelidos ou metem um envelope para cada um. Como quando fomos abrir a conta de garantia de renda em nome dos dois e, apesar de a conta principal estar apenas em meu nome, o apelido do macho da casa aparece como proprietário por default. Porquê? Ninguém nos perguntou nada. Não se parta de pressupostos.
 
  
 
 
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O ginásio onde ando tem uma modalidade em que com apenas uma inscrição os membros do agregado familiar podem todos frequentar o mesmo ginásio, ainda que não ao mesmo tempo. Quando fui perguntar se podia adicionar o D. à minha inscrição e quais as condições não conseguia dizer a palavra em francês. Posso muito bem ter passado por pessoa-a-quem-dá-quebras-a-meio-da-conversa-como-se-lhe-acabasse-as-pilhas porque fiquei uns 10 segundos a pensar a meio da frase. "Est-ce que je peux ajouter mon... ... ... ... ... ... ... mari à mon abonnement?" Não me saía a palavra francesa para namorado, acho que tem qualquer coisa a ver com "copin" ou "petit ami". Mas a mim não me soava certo (amigo? colega???) e o senhor que me estava a atender não ia perceber. Ia pensar que eu estava a falar de um amigo qualquer e teria que perder o dobro do tempo a explicar-me o que eu já sabia, que isto é só para pessoas do mesmo agregado familiar e que para amigos não dá. E eu tinha que lhe explicar de seguida que não, que ele vive comigo e que portanto somos do mesmo agregado familiar, está tudo bem. E isto é faladura francófona a mais para mim. Parceiro ainda soa pior, companheiro idem. Por isso agarrei na única palavra inequívoca, ainda que não seja a verdadeira, mas que me cortaria caminho na interação. E isto se calhar é precisamente o que o casamento é, poder-se falar para o exterior numa linguagem que toda a gente entende. É apenas esse o único propósito que lhe acho. Como a história do apelido: sinalizar a toda a gente, inequivocamente, que se é da mesma família.




S.   


terça-feira, 8 de abril de 2014

Isto nem é uma metáfora feminista mas podia ser

Notei há uns tempos, por puro acaso, que após uma corrida longa não há nada melhor do que andar de saltos altos.







(Alonga as palmas dos pés. Quem diria...)



S.

terça-feira, 1 de abril de 2014

Bom dia, Europa!

"Scotland to switch to driving on the right if independence given green light"

(...) "'It sends out an explicit signal: we are part of Europe,' said one of the brains behind the scheme. 'The little Englanders who want out of Europe are the only ones driving on the left-hand side. We've been the smaller relative dominated and having to copy their ridiculous ways for too long. No more. Just think, this will be an indignity for little England – isolated in Europe and pootling along in the slow lane on the left,' he added."

Notícias destas logo pela manhã fazem cócegas ao meu fascínio pelos nacionalismos UKianos. =)






S.