quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Não me mexam na língua!

Quando soube que o Jornal de Letras iria ser acompanhado por um livrinho explicativo do Acordo Ortográfico decidi comprar a edição desta semana.

Nunca fui contra o novo Acordo que parece indignar tanta gente, gente que chega a levar mesmo a peito as alterações e o considere um atentado à língua portuguesa (ainda que mais de 90% não saiba realmente o que vai mudar).

Não sou contra as pessoas que são contra o Acordo Ortográfico - felizmente vivemos em democracia há quase 40 anos e a liberdade de expressão e opinião são direitos consagrados na nossa lei fundamental.

O que me irrita mesmo é a ignorância e a estupidez, que leva muita gente a defender o seu desacordo com o Acordo com argumentos como "ai Jesus que agora vamos passar a escrever 'fato' em vez de 'facto' e 'pato' em vez de 'pacto'. Que ridículo Sócrates, hádes querer ser eleito outra vez, hádes." Que amor tão grande à língua portuguesa que os deixa assassinar a linguagem com tal desenvoltura.

Ser contra o Acordo é muito fácil; manter as coisas como estão é infinitamente mais simples e cómodo do que mudá-las. É normal, expectável (oh oh, expectável, e não expetável, porque o 'c' lê-se, minha gente) até, a resistência à alteração de algo que sempre foi assim desde os nossos 6 anos. Especialmente em algo tão pertencente à nossa identidade como é a língua. Eu, sendo uma freak da ortografia e da gramática, linguista-em-potência, compreendo bem esta relutância. Não compreendo é o histerismo.

Então, porquê ser a favor do Acordo?

Para mim, é muito simples: as línguas evoluem. Particularmente a grafia. Se assim não fosse, ainda escreveríamos em Português Medieval. Não indo tão longe, ainda escreveríamos com a grafia de Eça ou Pessoa. O nosso Português é menos correto do que o deles? Não. Então porquê pensar que o Português redigido sob o novo Acordo, o Português do futuro, será menos válido, verdadeiro ou rico do que o do presente?

O argumento do "ai que agora vamos passar a escrever à brasileiro" nem sequer é válido. Irão continuar a existir palavras que se escrevem de forma diferente nas duas línguas, já para não falar das diferentes expressões e diversidade linguística que continuará obviamente a existir.

Então qual é a regra? A regra é muito simples e lógica. As letras que não se leem, caem. É a aproximação da grafia à oralidade, a simplificação da ortografia, que nada rouba à riqueza da nossa língua. Parece-me uma alteração bem razoável. Este blog lá vai marchando ao sabor do novo Acordo, ainda que já tenha mandado fortes calinadas. Mas estou interessada em (re)aprender a escrever Português de qualquer das formas que ele seja atualizado. Desde que a atualização tenha pés e cabeça, o que é o caso.

Quem continuar acérrimo defensor do não ao Acordo Ortográfico, ou mesmo apenas não convencido, lembre-se: o mundo acaba dia 22 de dezembro de 2012, também nunca vão ser obrigados a escrever ação em vez de acção, nem outras monstruosidades semelhantes. =D




Além dos argumentos da lógica e do fim do mundo, este é outro bom argumento - provavelmente o melhor - para não se ser contra o Acordo Ortográfico



O PNR é.



S.

2 comentários:

  1. Eu pretenço ao grupo dos que são contra o AO, mas julgo poder justificar a minha posição. As línguas evoluem e essa evolução é desejável. Mas a evolução deve partir da própria língua, não ser imposta por critérios economicistas, como os que estão na base deste acordo. E deveria sempre haver lugar a uma discussão pública das alterações a introduzir, não dar o facto como consumado, sem dar cavaco a ninguém. A beleza das línguas está nas suas especificidades, qualquer tentativa de as homegenizar pode e deve ser considerado um atentado à sua identidade. Justifiquei?

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  2. Com certeza. No entanto, discordo que o acordo seja uma tentativa de homogenizar a língua portuguesa. Durante muito tempo perturbou-me o facto de virmos a escrever "brasileirismos", como jato, carater, etc. Mas o facto é que em muitas palavras, é o português europeu que se desvia do português brasileiro. Não fazia ideia de que vamos passar a escrever adoção mas os brasileiros continuarão a escrever adopção, por exemplo. Receção enquanto no Brasil continuará a escrever-se recepção. Isto porque a regra no acordo é a grafia aproximar-se à oralidade, daí que palavras ditas de forma diferente nos dois países se continuem a escrever de forma diferente. Creio que se fosse a homogeneidade que estivesse na base do acordo tivessem feito um esforço maior para corrigir estas diferenças que além de não desaparecerem, em alguns casos vão se acentuar.

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