A memória é traiçoeira e faz questão de ser seletiva à sua própria maneira, sem critérios que pareçam lógicos ao nosso consciente. Assim de repente, uma das memórias mais vivas que tenho de meus aniversários em criança era da minha alegria quando recebia pelo correio a prenda que todos os anos a Revista Barbie me enviava, tal como enviava (suspeito) a todas as suas jovens assinantes.
(Sim, eu fui assinante da Revista Barbie na minha infância/pré-adolescência. Sue me. Não me consigo sequer lembrar do conteúdo da revista, mas era minimamente interessante, já que era com entusiasmo que a recebia no correio.)
As prendas em questão não eram nada de especial. De todo. A única que me recordo consistia numa moldura de cartão (!! mais rasca não podia ser), pintada a cor-de-rosa-de-Barbie, e a dizer "Barbie" algures. Mas eu ficava fascinada que uma revista, presumidamente alguém - um alguém que eu desconhecia - se desse ao trabalho e à simples atenção de me enviar alguma coisa, qualquer coisa, no meu dia de anos.
Pois bem, hoje aconteceu o mesmo quando na minha caixa de correio eletrónico tinha um e-mail com desconto promocional na Etam, por ser o meu dia de anos. (Notem como dantes a prenda chegava pelo correio, da Revista Barbie; hoje chega pelo correio eletrónico, vindo de uma marca de lingerie. Como o tempo passa. E, oh meu deus, estou a descobrir um padrão na minha vida...) O entusiasmo foi o mesmo, a sensação que se tem de se ser especial, neste dia que não é igual a mais nenhum do ano, fez despoletar a memória das prendas que eu recebia da R. Barbie. O que me fez pensar que, realmente, por mais que eu ache e me convença que o dia 1 de setembro é-me agora completamente igual a qualquer outro do ano, não dá para lhe ser completamente indiferente. Agora, a única diferença é que fico nervosa se as pessoas me perguntam quantos anos tenho, logo neste dia, porque já entrei na fase do "23, mas quem é que está a contar?" E depois engulo em seco.
E o tempo que demora a habituar-me a dizer que já tenho mais um ano é agora maior. Faltavam 10 minutos para a meia noite e eu comecei a entrar em pânico. "D., eu não quero fazer anos! Quero ficar nos 22... Mas tinha que me matar não era?" "Era.", diz D. num tom de voz completamente normal, um bocado indiferente às minhas tendências suicidas pré-aniversário, demonstrando que o pobre coitado já convive comigo há demasiado tempo e está habituado à diarreia verbal com que o bombardeio frequentemente. Enfim, o meu desejo de paragem no tempo não se realizou e eu fiquei um ano mais velha em apenas um segundo. Há pessoas que não querem fazer 30, 40, 50 anos, eu não queria fazer 23. Porque gosto de capicuas. E de patinhos.
Sempre gostei muito de fazer anos no primeiro de setembro. Quer dizer, sempre é uma mentira, já que quando era criança vivi com a angústia de não poder levar um bolo de anos para a escola e ter a turma toda a cantar-me os parabéns. E ter muitos amigos a faltar às minhas festas de aniversário porque íam para o Algarve. Escusado será dizer que até recentemente odiava o Algarve. Mas hoje gosto. É o dia que marca o fim do verão oficial, ainda que não o formal, é o retomar da rotina, é o arrumar das toalhas de praia, chinelos e fatos de banho. Setembro tem cheiro a livros escolares novos, material a estrear, cadernos em branco, promessa de novas coisas e novo conhecimento. Fim antecipado de férias monstras que sempre me entediaram pela sua extensão desmedida (cheguei a ter 4 meses de férias de verão). Primeiro de setembro está fortemente associado no meu inconsciente a magia, a um novo ano, porque *HP alert* é o dia do início do ano letivo em Hogwarts, da viagem desde King's Cross até à Escócia que eu um dia irei fazer *fim de HP alert*.
Por isso, é com alegria que me despeço do verão e sem qualquer ressentimento por este tempo que parece aborrecer tanta gente. Que venha o frio, muito frio, que venham as botas peludas, os casacos quentinhos, os roupões peludos e o edredão de inverno, para me enroscar que nem uma lagarta num casulo. Que venha o hot chocolate! Os dois pares de leggings. Só não venha o chapéu de chuva. Espero não me estar reservada mais chuva do que aquela que apanhei em Londres (e isto é dizer muito, muito pouco).
Para aplacar os espíritos odiadores de inverno. Como se pode não ansiar pelo inverno depois de uma coisinha destas?
S.
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