quarta-feira, 25 de abril de 2012

I AMsterdam

Para não correr o risco de parecer demasiado efusiva e não me tomarem a sério por estar de ressaca desta cidade, não vou dizer que Amsterdão é perfeito. Mas Amsterdão mostrou-me tudo o que uma cidade pode ser.

Diria que é o cocktail do melhor que há dos diversos tipos de cidade: grande sem ser gigante, calma mas vibrante, cafés, restaurantes, lojas únicas que suscitam a curiosidade nas vielas mais inesperadas, árvores que ladeiam canais, fachadas centenárias, bicicletas aos montes e às filas, tudo limpo, tudo agradável e de deleitar os sentidos como eu nunca experienciei.

Ganhei um novo conceito de "plano". Eu que pensava que conhecia esta palavra enganei-me redondamente. A expressão "ao nível do chão" ganha redobrado sentido, também. Por quilómetros e quilómetros não há o mínimo declive natural; os escassos declives existentes são feitos pelo Homem, como as pontes arqueadas. Tudo naquela cidade conspira para a utilização das pernas e dos pés, e para que o carro seja uma coisa desprezível: os canais que convidam ao passeio ao longo das suas margens, os passeios e ruas largas, o "plano", a beleza circundante, o sentimento de segurança e bem-estar geral.

Porque nunca eu pensei visitar uma capital onde não houvesse locais duvidosos. Não há áreas graffitadas, sujas ou desertas que emanem ar de crime, mesmo de dia. Todas as cidades têm; Bruxelas, Lisboa, Londres não são exceção. Mas Amsterdão parece que é. Não arrogo ter obtido um conhecimento total da cidade, afinal foram apenas três dias, mas palmilhámos muita milha de chão amsterdiano e ao segundo dia já eu franzia a testa com a estranheza de não termos passado ainda em nenhuma zona percetivelmente insegura. (Red Light District não conta, por amor de Deus, aquilo é só uma rua e demorámos bastante tempo a dar com ela. E tem um canal no meio - com cisnes brancos!! -, pontezinhas bonitas, nem com mulheres semi-nuas nas janelas daquelas fachadas centenárias aquilo assusta...)

Cheguei a pensar que o centro da cidade poderia ser exceção, que normalmente as capitais têm sempre subúrbios duvidosos, fora dos circuitos turísticos cuidados e que portanto a minha opinião poderia mudar assim que chegasse à zona da cidade onde ficava o nosso hotel. Falso. Mais uma vez, tudo de uma planície que mete impressão, surpreendente olhar para uma rua e ela seguir sempre em frente até onde os olhos deixam de poder alcançar. Tudo cuidado, tudo verde, estradas largas, passeios amplos, árvores, arbustos, mais canais, mais patos e cisnes. E os limites da minha imaginação a serem impossivelmente estendidos pelo que eu estava a ver na realidade, uma qualidade de vida incalculável e desesperadamente invejável.

Estes adjetivos estão a dar cabo de mim, até enquanto me leio percebo o quão embriagada ainda estou por esta cidade. Mas é isto mesmo que se quer registar: impressões, o menos filtradas pelo tempo e pela vivência possível.


Tudo a andar de bicicleta com diversos arranjos bicicletianos: cestos à frente, caixas da fruta atadas em frente ao volante, malas de carteiro na parte de trás, bancos de criança na traseira da bicicleta, espécies de carrinhos de mão com pedais para acartar filhos, pessoas adultas à boleia sentadas atrás do condutor. Ali, carro é sinónimo de nojo, inconveniência, matacão. Nem transportes públicos são necessários: metro muito pouco desenvolvido e autocarros no centro da cidade nem vê-los. Apenas trams, que se dão extremamente bem em planícies e não contribuem para a poluição do ar citadino.

Ali, os dias amanhecem chuvosos e cinzentos, mas ao longo do dia enrolam-se as nuvens e o sol dá ar da sua graça, tornando uma cidade inerentemente agradável num deleite para a vista. Os pés não querem parar e ganham vida própria; deixam-se guiar pelos olhos, sem grande cortesia para mapas (acabámos por arranjar um, para sabermos onde era a casa da Anne Frank e o Voldenpark) ou guias. Stress reduzido a zero.

Um senão atravessava-me constantemente a mente: Só é pena a língua. Ao terceiro dia já eu dizia "Que se LIXE a língua, vou aprender holandês e mudo-me JÁ para aqui." Vejam o estado de embriaguez, Deus meu.

Várias vezes me cruzou também a memória um bocado de uma conversa que ouvi há muitos anos, num avião de regresso dos EUA. Uns portugueses falavam entre si "O que é que achaste de Nova Iorque?", "Achei que era assim uma mistura entre Londres e Amsterdão". Na altura achei isto muito pretensioso - o tom de voz com que foi dito foi digno de um Castelo-Branco - mas a verdade é que isto ficou guardado nos recônditos da minha mente. E dei por mim a puxar pela memória visual de há oito anos em busca de comparações possíveis com esta cidade onde eu agora me encontrava. Não cheguei a nenhuma conclusão a não ser com a qual comecei este post: Amsterdão é tudo o que uma cidade pode ser porque tem nela tudo o que de melhor as cidades pelo mundo são.





S.

2 comentários: