segunda-feira, 9 de julho de 2012

O guia xenófobo sobre os portugueses

Há um tempo atrás deparei-me com uma coleção de livros na papelaria do Parlamento que me captou imediatamente a atenção. Trata-se nada mais nada menos do que guias xenófobos sobre várias nacionalidades. Ou seja, pequenos livrinhos de bolso que versam sobre as características de cada povo europeu sob o olho generalizador de um estrangeiro.

Muito me aborrecia nunca ter encontrado o que eu mais curiosidade tinha em ler: o que versava sobre os portugueses, claro está. Como os livros estavam arrumados numa prateleira giratória sobre o balcão, sempre que ía pagar qualquer coisa mirava-os tentando antever que preconceitos e estereótipos os autores teriam escolhido. Havia o guia xenófobo sobre os franceses, os suecos, os ingleses, os espanhóis, os irlandeses e afins. Foi só quando vi o livro sobre os estónios que pensei "Fogo, se se deram ao trabalho de escrever um guia xenófobo sobre os estónios tem que haver um sobre os portugueses!" Rodopiei o expositor giratório com toda a convicção e o meu coração deu um pulo quando li "Portuguese" na lombada de um dos livrinhos. Juntei-o ao envelope que ía pagar sem hesitação.




E se valeram a pena todos os cêntimos que dei por ele!

A capa começa bem. A antiga caravela mais o galo de Barcelos, como não podia deixar de ser, e até uma camisola da seleção mostra que em princípio os estereótipos estão todos lá. Segue-se um mapa para abrir a narrativa, bastante preciso, por sinal (fora o "The Alentejanas" que não faz muito sentido e que acho que era suposto ser "Os Alentejanos"):




Gosto especialmente do "void" na parte espanhola da Península. E dos "mouros" no norte de África. Depois temos como únicas terras apontadas Lisboa ("lettuce eaters" hahahaha!), Porto ("tripe eaters" hahahahaha!), Fátima e Olivença ("used to be ours"). "Começa bem", pensei logo eu.

Depois temos a brilhante descrição dos portugueses que eu achei acertada e que nos diferencia dos outros sulistas: 

"Podem estar na mesma turma que os europeus do sul, mas os portugueses são os alunos tímidos que se sentam lá atrás na esperança de não dar nas vistas. Ser português significa ser reservado: aquela exuberância gesticuladora pertence aos seus primos mediterrânicos."

...

Muito bem, sim senhora, aplica-se à generalidade dos portugueses que eu conheço. Mas claramente este senhor (inglês) nunca foi ao Norte.

 O livro lê-se numa hora, hora e meia. Ía-me deliciando com cada página que virava. Há coisas que não sei onde o autor foi buscar e que me fizeram exclamar "Hã?!"s mais do que uma vez, e palavras portuguesas mal escritas como "descenrascanço" (que o senhor inglês diz que é no que os portugueses são melhores) que me deram vontade de escrever e-mail para a editora a reclamar "Escrevam essa porcaria em condições!!! E em proofreading, nunca ouviram falar?!", mas no geral está muito bem conseguido. 

Acho que vou abrir nova rubrica para falar um bocadinho destes estereótipos e encher isto de citações do livro só porque sim (I'm lazy and I know it). Logo se vê.



S.

7 comentários:

  1. Gostava de ler. Parece bem divertido :)

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  2. É, dá para dar umas boas gargalhadas ou levantar sobrancelhas quando não se percebe bem onde é que o autor foi buscar certos reparos sobre as nossas características nacionais...

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  3. Delicioso!

    Também adorei o vazio espanhol... suspirei ao imaginar uma imensa planície florida até França eheh
    E o Brasil que era nosso.
    E os moiros... aliás quando a S. disse na nossa conversa no blogue da Luna que devíamos lutar pela emacipação das muçulmanas acho que o meu gene afonsino anti-moirama se acendeu. :D

    Fico a aguardar mais pedacinhos de texto.

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  4. Sim, queremos saber mais :) Pelo menos eu quero. Cá em Portugal não se compra pois não? :(

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  5. Just José: Há um reparo que o autor faz a certa altura sobre os nossos programas meteorológicos figurarem apenas um retângulo cheio de sóis, e sem nada no lugar onde devia aparecer Espanha. Nunca tinha reparado nisso mas o autor tem razão...

    Carlota: A Amazon, sendo a espécie de biblioteca nacional que é, deve vender. Mas nunca me tinha deparado com a coleção antes, realmente :)

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  6. "Juntei-o ao envelope que ía pagar sem hesitação."
    "Ía-me deliciando com cada página que virava."

    no meu proofreading esses "ia" acho que não levam o acento :) mas tb é verdade que o blog (ainda) não é um livro :)

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  7. ... Muito bem notado. É como se costuma dizer: pela boca morre o peixe.

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