Ontem nevou em Londres. Uma série de recordações passaram de rajada e a nostalgia instalou-se.
Pensar em Londres é uma coisa que tenho evitado nos últimos meses. Por uma questão de sobrevivência e sanidade mental, na lógica do "não chorar sobre leite derramado", e porque, bem ou mal, é uma fase que já passou, e é preciso é olhar para a frente, não para trás. As saudades são de um tipo muito diferente do que eu imaginei: não me dá ataques de pânico nem de nostalgia, nem passo os dias a suspirar pela cidade. Em vez disso, é uma nostalgia muito mais profunda, submersa e letárgica, que sei que está lá mas que não se manifesta abertamente. E ultimamente, as memórias da cidade e da minha (nossa) vida lá vão sendo cada vez mais desfocadas, mais afastadas da realidade, menos vívidas. Um bocadinho como a sensação que temos de um sonho, não saber bem se aquilo aconteceu ou não. As coisas mais aleatórias são as que por vezes me surgem mais nítidas na mente, como quando o "por favor, tenha atenção ao intervalo entre o cais e o comboio" me despertou - sem surpresa, para dizer a verdade - a frase que mais vezes ouvi lá, na voz perfeitamente nítida do senhor que anunciava a toda a abertura de portas: "please mind the gap between the train and the platform edge".
Estupidamente, recusei-me peremtoriamente a voltar à cidade nestes últimos meses. Pretextos não me faltaram: a abertura da loja dos M&Ms, as duas grandes amigas que me ficaram do curso e que lá continuaram a viver, ou a entrega da tese. Mas havia uma recusa em voltar áquela cidade na qualidade de turista, voltar aos sítios familiares e vê-los a partir de uma lente diferente, o medo de os modificar na minha memória e de ser obrigada a admitir, sem possibilidade de desculpas, que a minha casa já não é ali.
Parece inoportuno estar com estes desabafos todos, numa altura em que o que tem de dominar é a perspetiva de Bruxelas, mas a verdade é que não sinto Londres como um capítulo fechado. Gostava de lá voltar a viver. Hei-de lá voltar, muito provavelmente para a próxima fase académica (sim, o doutoramento, ainda que longínquo no tempo, já é coisa que me ocupa um pedacinho de mente). Isto pensando no grande esquema das coisas. No pequeno e mais próximo esquema das coisas, o próximo passo envolve uma visita à cidade, daqui a um mês, para a minha graduation da King's. Pode ser que aí, obrigada a ver a cidade pela perspetiva do visitante, e com o festejo do encerramento do meu ciclo de estudos, eu sinta a visita como uma catarse que dite o encerramento desse capítulo da minha vida no meu subconsciente. Ou talvez não. O mundo é tão grande e o futuro tão aberto e incerto que não faço ideia onde a minha vontade, os meus gostos e a nossa vida nos levará a seguir.
Por agora, uma graduation me espera. E dois pares de braços também.
S.
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