Há uns meses valentes, dizia-me o D. assim: "Eh, 'bora de Bruxelas a Portugal de bicicleta!" Eu acho que na altura não disse nada porque fiquei muito ocupada agarrada à barriga a rir. Mas nos tempos seguintes comecei a ponderar, a admirar a coisa de diversos ângulos e a magicar maneiras de a tornar possível. Como acontece aliás sempre que ele vomita uma ideia estrombólica deste tipo (cofvamosviverparalondrescof). Depois a coisa já era "Eu hei-de ir a Portugal de bicicleta..." E eu tornei-me condescendente: "Hmm-hum, claro que vais, se nem em Bruxelas andas, deves ir." Mas a ideia, na sua teoria, vá, até era fixe e seria uma mega conquista e uma oportunidade perfeita para palmilhar, quase literalmente, um bom pedaço da Europa, e eu até ia todos os dias para o trabalho de bicicleta e tal, comecei a dar algum crédito à coisa. Seria difícil mas não impossível e inesquecível decerto. Depois até descobri a rede EuroVelo e fiquei fascinada com a prospetiva de uma Europa toda ciclável e ganhei balanço. Chegámos a estimar dias e quilómetros, se faríamos pela costa francesa e espanhola ou cortando caminho pelo interior (eu dizia-lhe: "Há PIRINÉUS pelo meio" mas ele não queria saber), estivemos quase a comprar bicicletas para começar a visitar cidades belgas aos fins-de-semana (sempre Waterloo...), chegámos a sonhar visitar uma cidade de cada país aqui à volta só para dizer "Eu fui a [inserir país vizinho da Bélgica] de bicicleta e voltei!", eu sempre a insistir em irmos a Londres dando ao pedal e quase morrendo de desgosto por saber que o ferry de Calais-Dover ou Ostende-Southampton só transporta carros (sempre a Inglaterra...).
Entretanto a nossa partida definitiva da Bélgica chegou mais abruptamente do que o previsto e a ideia foi posta de parte. No final de junho iremos para Portugal, em setembro este blog voltará para o sítio que lhe deu o nome. A univ/cidade ainda não está escolhida mas a volta para a ilha já é uma certeza.
Mas... Mas. Há outra coisa. Surgiu a ideia (ou ressurgiu, nem sei com certeza), tão repentina mas tão avassaladora - e as melhores ideias surgem assim, já percebi - de uma volta a Portugal em bicicleta. "Se não dá a viagem maior, faça-se esta por Portugal, já que vamos ter umas férias mais alargadas do que o previsto", disse-me ele. E eu, contra todo o meu instinto dos "mas" e "se"s compulsivos disse: "'Está bem." É que, entendam, depois de termos passado meses e meses a considerar distâncias de 2000 e tal quilómetros e ver como enfiar aquilo em três semanas, olhar para o mapa do litoral português e ver que de cima a baixo são 700, a coisa parece uma brincadeira de crianças. E eu agora até corro fixe e tal, há-de dar, pensei eu. É a confiança de que o meu corpo é imparável e os seus limites serão apenas os que eu lhe impuser. Ou isto é uma revelação extremamente sábia ou a corrida queimou-me o cérebro todo, ainda não sei dizer.
Assim, e porque já sei que é certo e já temos um percurso (em rascunho), as datas alinhavadas e as linhas gerais de logística traçadas, eu posso dizer, com certeza, que o próximo julho será passado numa bicicleta (duas). Iremos de Viana do Castelo a Vila Real de Santo António, em 29 dias, sempre pela costa portuguesa (os emigrantes querem é praia e sol, of course). O entusiasmo é enorme, a antecipação também, o nervoso miudinho é que nem por isso. E isto é estranho. Tenho assim novo objetivo para lá da Meia-Maratona/Corrida dos Sinos: convencer as minhas pernas que pedalar 50 km por dia durante um mês é very nice.
Escusado será dizer que este blog em julho vai estar a abarrotar irritantemente de descrições de quilómetros feitos, dores nas pernas, escaldões no pescoço e outros pormenores que provavelmente só a nós interessarão. Escusado será também dizer que todas as dicas, experiências, conselhos e coiso serão extremamente bem acolhidos por estes dois jovens amadores que não têm nenhuma experiência com viagens de bicicleta, só uma pancada muito grande nestas duas cacholas.
Era para ser uma destas mas eu sou fraca demais para puxar pelos dois e control-freak demais para me deixar ser puxada.
S.
uma amigo da minha irmã foi viver para barcelona e decidiu ir de bicicleta. Enviou as coisas todas primeiro por camião e depois lá foi ele na sua singela bicicleta, mas não sei quanto tempo demorou (só sei que isto já foi há anos e ainda hoje é lembrado).
ResponderEliminarTandems: já andei num (na china!) e não aconselho, é mito difícil harmonizar as pedaladas, quanto mais em grandes distâncias.
De resto, acho uma ideia fantástica, uma daquelas coisas que deveriam estar na lista das "100 coisas que devemos fazer na vida" de qualquer um :)
Ah, aprendi a palavra "tandem" com o Jerome K Jerome, a quem te aconselho vivamente a ler, se estás a pensar fazer essa viagem - em EN é do melhor, de morrer a rir - Three Men on the Bummel,e já agora lê também o Three Men in a Boat (To Say Nothing of the Dog), igualmente hilariante
ResponderEliminarAaai, se o D. lê isso de Barcelona vai recomeçar a insistir para irmos de Bruxelas a Portugal outra vez.
ResponderEliminarAs tandems nunca experimentámos mas sempre me pareceu isso mesmo, que tinha que haver uma sincronização quase perfeita para funcionar. E numa viagem longa, em que há muito esforço e ritmos diferentes, não me parece boa ideia. E depois é o facto de quem vai a trás não ver o caminho, mete-me muita impressão isso.
Quanto ao livro, obrigada pela sugestão. Há um blogger, o Andrew P. Sykes do Cycling Europe, que já fez duas viagens a atravessar a Europa. Também escreveu um livro, mas o blog dele tem detalhes bastante úteis e precisos sobre a preparação das viagens. Foi a nossa inspiração. Mas quantos mais exemplos melhor!
mas o jerome k jerome não é bem um livro com "instruções e dicas". Se leres vais ver :)
ResponderEliminarHaha, espero bem que não, é passado no séc XIX! :D (só agora fui ver) Mas há-de servir de inspiração na mesma.
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